A instalação elétrica restaurante requer projeto e execução que priorizem segurança operacional, continuidade de fornecimento, conformidade com as normas brasileiras e proteção contra riscos específicos de cozinhas comerciais (ambiente gorduroso, umidade, altas temperaturas e cargas motorizadas). Este manual foi elaborado com base nas práticas exigidas pelas normas NBR 5410, NBR 14039 e na legislação de segurança do trabalho NR‑10, integrando procedimentos de engenharia, dimensionamento, proteção, aterramento, coordenação e manutenção para proprietários, gestores prediais e profissionais responsáveis técnicos (ART/CREA).
Fundamentos técnicos e critérios de projeto
O projeto de uma instalação elétrica para restaurante deve iniciar pelo levantamento de cargas, definição da forma de atendimento (baixa tensão padrão, ramal de média tensão quando aplicável), análise de demanda e aplicação de fatores de simultaneidade. Priorize a separação de cargas por áreas funcionais: cozinha (fornos, fritadeiras, chapas, coifas, exaustores, refrigeradores), salão (iluminação, tomadas de uso geral, equipamentos de áudio/iluminação), áreas técnicas (câmaras frias, centrífugas), apoio (lavagem, sanitários) e serviços (ar condicionado, elevadores, casa de máquinas).
Levantamento e classificação de cargas
Calcule potência instalada por equipamento com base nas plaquetas e especificações do fabricante. Considere cargas contínuas (>3 h) e intermitentes, motores com corrente de partida elevada e cargas não lineares (inversores, fornos de indução, VFDs). Aplique fatores de simultaneidade conforme experiência técnica e tabelas normativas, justificando critérios no memorial de cálculo. Registre potência ativa (kW), potência aparente (kVA) e fator de potência.
Dimensionamento de demanda e seletividade
Dimensione a alimentação principal com margem para expansão e para correntes de partida. Realize cálculos de curto‑circuito e verifique a capacidade de interrupção e seletividade dos dispositivos de proteção. Para médias e grandes cozinhas, considere alimentação trifásica com balanceamento de cargas por fase e uso de condensadores para correção do fator de potência, sempre avaliando efeitos de harmônicas e a necessidade de filtros detuned.
Critérios de queda de tensão e condutores
Projete a queda de tensão máxima admitida respeitando a NBR 5410 (usualmente ≤ 4% para circuitos terminais e ≤ 5% para toda a instalação, salvo justificativa técnica). Escolha seções de condutor considerando corrente contínua admissível, agrupamento, temperatura ambiente elevada (cozinha) e correções por fatores de agrupamento e condição de instalação (e.g., eletrodutos embutidos, bandejas sob laje quente). Utilize cabos com isolamento adequado (cabo unipolar ou multipolar em bitolas que atendam à corrente e à queda de tensão) e prefira isolação tipo XLPE para trechos sujeitos a temperaturas elevadas ou quando houver necessidade de maior desempenho térmico.
Normas, responsabilidades e documentação técnica
Os projetos e execuções devem estar formalizados por profissional habilitado, com emissão de ART no CREA. Atue conforme NBR 5410 (instalações elétricas de baixa tensão), NBR 14039 (instalações elétricas de média tensão, quando aplicável) e NR‑10 (segurança em instalações e serviços com eletricidade). Integre exigências locais do Corpo de Bombeiros em relação a partidas de emergência e soma de cargas para sistemas de combate a incêndio quando for o caso.
Projetos executivos e diagramas
Entregue memorial descritivo com cálculos de carga, curva de demanda, tabela de condutores, dimensionamento de quadros, esquema unifilar, planilhas de dispositivos DR/DPS, detalhamento do aterramento e estudo de curto‑circuito. Indique as características dos equipamentos: disjuntores termomagnéticos, disjuntores de potência (MCCBs), fusíveis NH, relés de proteção e se aplicável relés de tensão/tempo para motores. Anexe relatório de análise de risco elétrico conforme NR‑10.
Responsabilidades técnicas
O responsável técnico deve registrar a ART tanto do projeto quanto da execução e manutenção quando contratadas. É responsabilidade do projetista indicar dispositivos de proteção diferencial residual ( DR), proteção contra surtos ( DPS), sistema de aterramento e limites de seletividade. A aceitação da obra deve incluir termo de vistoria e lista de comissionamento assinada pelo engenheiro responsável.
Tipos de instalação e arquitetura elétrica
Defina arquitetonicamente a instalação elétrica em três níveis: entrada de serviço, quadros de distribuição (QGBT, QDL), e circuitos terminais. Em restaurantes, recomenda‑se segmentação rigorosa das alimentações críticas (cozinha e refrigeração), alimentação de emergência e quadros para iluminação e tomadas.
Entrada de serviço e medição
Considere a instalação do medidor, transformadores de instrumentação quando necessário e o quadro geral de baixa tensão (QGBT) posicionado em local ventilado e com proteção contra vapores e gordura. Para alimentações em média tensão aplique NBR 14039 e dimensione subestações conforme normas e exigências do concessionário.
Quadros e distribuição
Projete o QGBT com barramentos dimensionados para o curto‑circuito máximo calculado, espaço para expansões e sinalização adequada. Distribua quadros setoriais (cozinha, refrigeração, salão, emergência) próximos às áreas de maior consumo para reduzir cabos longos. Utilize barramentos em cobre e grau de proteção mínimo IP54 para áreas externas e IP65/66 em áreas com lavagem. Separe circuitos de potência dos circuitos de comando e controle.
Circuitos terminais e tomadas
Identifique circuitos exclusivos para equipamentos como fornos elétricos, fritadeiras e compressores; estes devem ter proteções individuais com curva apropriada (curvas D ou K para motor/indutivos). Tomadas de uso geral em salão devem ser protegidas por DR de 30 mA conforme orientação da NBR 5410. Quando houver equipamentos fixos com necessidade de continuidade, utilize pontos de alimentação direta com plugue industrial e identificação clara no quadro.
Componentes críticos e especificações
A escolha de materiais e dispositivos impacta diretamente na segurança e confiabilidade. Detalhe técnico de componentes críticos é essencial para um restaurante operar sem riscos elétricos.
Dispositivos de proteção – disjuntores, fusíveis e relés
Selecione disjuntores termomagnéticos e eletrônicos com curvas e ajustes conforme a natureza da carga. Para proteção de motores, prefira inversores de partida ou soft starters com proteção térmica e relés térmicos/eletrônicos. Utilize fusíveis NH em painéis de potência quando necessário, garantindo coordenação fusível‑disjuntor. Realize estudo de coordenação para garantir seletividade e proteção adequada ao usuário.
Proteção diferencial residual e proteção contra surtos
Instale DR (RCD) nas linhas de tomadas e circuitos de área molhada; a sensibilidade recomendada é 30 mA para proteção de pessoas. Para proteção de equipamentos sensíveis (refrigeradores, equipamentos eletrônicos, PDVs) e para proteção da instalação contra surtos atmosféricos e transientes, projete um sistema de DPS em cascata: classe I (entrada de serviço) + classe II/III (quadros locais). Atente-se à coordenação entre os DPS para garantir a proteção adequada e norma IEC/NBR aplicável.
Aterramento e equipotencialização
Implante sistema de aterramento com condutores de proteção e malha de terra dimensionada por cálculo. A NBR 5410 exige equipotencialização das massas e condutores de proteção, conectando estruturas metálicas, carcaças de equipamentos e tubulações metálicas. Para redes TN‑S prefira continuidade do condutor de proteção φ separado; em sistemas TN‑C‑S observe as exigências normativas quanto à parte PEN. Calcule a impedância de falta para garantir acionamento do dispositivo de proteção dentro dos tempos máximos de desconexão previstos na norma.
Sistemas de emergência e geração automática
Para continuidade, dimensione geradores e sistemas ATS (Automatic Transfer Switch). O projeto do grupo gerador deve considerar partida de motores e picos de demanda; implemente transferência de cargas críticas prioritárias (refrigeração, coifas, iluminação de emergência). Em sincronismo com a concessionária, assegure tratamento correto do neutro e esquema de aterramento do gerador conforme recomendações do fabricante e das normas aplicáveis.
Cabos, eletrocalhas e proteção mecânica
Use cabos com isolamento adequado a temperatura e ambiente (p.ex. XLPE/PVC com cobertura resistente a agentes químicos/gordura). Em trechos expostos em cozinhas, prefira conduítes ou eletrocalhas metálicas com grelhas para evitar acúmulo de gordura. Respeite as distâncias de separação entre circuitos de força e sinal e use prensa‑cabos adequados em painéis. Execute curvaturas e fixações em raio compatível com o fabricante para evitar esforços nos condutores.
Segurança operacional e conformidade normativa
A segurança elétrica em restaurante envolve proteção contra choques, incêndio e falhas operacionais. A integração do projeto com procedimentos de trabalho, equipamentos de proteção individual (EPI) e manutenção preventiva é mandatória conforme NR‑10.
Proteção contra choques elétricos
Adote medidas de proteção por isolamento, barreiras e DR. Realize cálculo e verificação da impedância de loop para assegurar que os dispositivos atuem dentro do tempo exigido. Em áreas com risco aumentado (cozinha, lavagem) aplique equipamentos com grau de proteção IP elevado e caixas com vedação adequada. Inclua sinalização e identificação das áreas de risco e pontos de seccionamento.
Prevenção de incêndio por causas elétricas
Dimensione condutores com margem térmica, utilize proteção térmica e proteção contra sobrecorrente corretamente coordenada. Evite emendas mal executadas e certifique‑se de que terminais e barramentos sejam inspecionados e apertados conforme torque do fabricante. Mantenha passagens de cabos limpas de gordura e cumpra a manutenção de coifas/exaustores para reduzir deposição de material inflamável próximo a condutores elétricos.
Requisitos de NR‑10 e gestão de risco
Implementar análises de risco elétrico, procedimento de bloqueio e etiquetagem (lockout/tagout), treinamentos periódicos, certificação de profissionais qualificados e uso de EPI adequados. Toda intervenção em partes energizadas somente deve ocorrer quando justificadas e com plano de trabalho específico aprovado pelo responsável técnico, atendendo a medidas administrativas e de proteção coletivas/grupais.
Comissionamento, ensaios e aceitação
O comissionamento é fase crítica para validar segurança e funcionamento. Registre ensaios, medições e aprovações no termo de entrega.
Ensaios básicos
Execute ensaios de continuidade dos condutores de proteção, medição de resistência de isolamento entre fases e fase‑terra, medição de resistência de aterramento e verificação de impedância de loop. Realize verificação de torque em barramentos e conexões, testes funcionais de DR e DPS, e ensaios de partida de motores na presença do fabricante quando aplicável. Documente resultados e compare com os critérios de aceitação estabelecidos no projeto.
Checklist de comissionamento
Inclua: verificação de etiquetagem e identificação de circuitos; leitura da curva de disparo dos disjuntores; validação da seletividade; teste de transferência automática (ATS); inspeção visual de instalações em áreas de cozinha quanto a proteção IP e acessibilidade; e verificação de iluminação de emergência. Registre não conformidades e plano de correção antes da liberação operacional.
Manutenção preventiva, inspeção e monitoramento
Um plano de manutenção mantém a segurança e reduz eventos que afetam operação e conformidade legal. Estabeleça periodicidade com base em criticidade dos equipamentos.

Rotinas e periodicidade
Recomenda‑se:
- Inspeções visuais mensais: condições de cabos, plugues, tomadas e quadro de distribuição; Termografia semestral: detecção de conexões aquecidas e desequilíbrios; Testes de DR trimestrais (testes manuais) e testes funcionais anuais documentados; Medição de resistência de aterramento anual ou após alterações na instalação; Revisão e aperto de conexões e parafusos em quadros anualmente; Verificação de DPS após surtos importantes e substituição conforme estado ou vida útil do componente.
Monitoramento e manutenção preditiva
Implemente registros de cargas e monitoramento de energia (medidores de energia por quadro/setor), utilizando análise de consumo para detectar falhas, desequilíbrios e perda de eficiência. A medição de energia também subsidia ações de eficiência e cálculo correto de geradores e bancos de capacitores.
Modernização, eficiência energética e mitigação de riscos
Atualizações tecnológicas ajudam a reduzir custos e aumentar segurança. Planeje modernizações graduais para minimizar impacto operacional.
Correção do fator de potência e qualidade da energia
Projete bancos de capacitores para correção do fator de potência visando reduzir perdas e multas. Em presença de cargas não lineares (fornos, inversores, fornos de micro‑ondas), avalie a necessidade de filtros harmônicos ou bancos de capacitores detuned (6% a 7% tipicamente) para proteção contra ressonância e danos. Realize análises de qualidade de energia antes da instalação de bancos de capacitores.
Soluções para redução de demanda e eficiência
Adote iluminação LED de alto rendimento com controles (dimmer, sensores de presença e controle por zonas), automação de HVAC para redução de consumo em horários de menor ocupação e VFDs com filtros para partidas suaves de motores, reduzindo picos de corrente. Substituições devem considerar a compatibilidade eletromagnética e proteção contra harmônicas.
Sistemas inteligentes e proteção remota
Implemente monitoramento remoto de quadros (SCADA leve ou medidores de energia com comunicação) para supervisão de alarmes, energias e estados de proteção. A telemetria permite ações preventivas e respostas rápidas a falhas, além de registrar eventos para auditoria técnica e regulatória.
Resumo técnico e recomendações de implementação
Resumo técnico: a instalação elétrica restaurante requer projeto detalhado, dimensionamento de carga e demanda, segregação e balanceamento de fases, proteção adequada com DR e DPS, aterramento e equipotencialização conforme NBR 5410, e, quando aplicável, consideração das exigências de NBR 14039 para média tensão. A segurança em operação e nas intervenções deve obedecer à NR‑10, com ART e responsabilidade técnica do CREA.
Recomendações de implementação práticas:
- Contrate engenheiro eletricista habilitado para projeto e execução, com emissão de ART e memorial de cálculo completo; Segmentar quadros por área funcional (cozinha, refrigeração, emergência) e priorizar alimentação de cargas críticas; balancear cargas e dimensionar cabos para queda de tensão ≤ 4% quando possível; Instalar DR 30 mA em circuitos de tomadas e áreas molhadas; DPS em cascata na entrada e quadros locais; coordenar proteções para seletividade; Dimensionar aterramento por cálculo e garantir impedância que permita a atuação dos dispositivos de proteção dentro dos tempos previstos na NBR 5410; Planejar geração de emergência (grupo gerador + ATS) com transferência de cargas críticas e esquema de neutro/aterramento compatível com a concessionária e a própria instalação; Incluir medidas contra riscos específicos de cozinha: proteção IP adequada, materiais resistentes a gordura e limpeza, rotinas de manutenção e inspeção termográfica; Documentar e registrar ensaios de comissionamento, manutenções e treinamentos conforme exigências normativas; estabelecer rotina clara de inspeção e manutenção preventiva.
A aplicação correta desses princípios evita riscos de choque e incêndio, assegura conformidade normativa e mantém a continuidade do negócio. Para execução, anexe ao projeto os cálculos de curto‑circuito, seletividade, queda de tensão, especificações de equipamentos e cronograma de testes, garantindo que a obra seja entregue com documentação assinada pelo responsável técnico e com plano de manutenção e operação disponibilizado ao gestor do estabelecimento.
